O dolo eventual e o caso da boate Kiss
Você acompanhou o julgamento do caso da boate Kiss? Há quase 9 anos, ocorreu uma tragédia em uma boate na cidade gaúcha de Santa Maria que matou 242 pessoas e deixou 636 feridas, todas foram vítimas de um incêndio, que começou no palco, onde se apresentava uma banda, e logo se alastrou, provocando muita fumaça tóxica. Recentemente, o caso foi à Júri popular e, após 10 dias de sessões, foi alcançado o resultado que condenou os 4 réus por homicídio simples com dolo eventual.
Eu sou a Cris Dupret, sou presidente do IDPB, professora de Direito Penal e advogada criminalista na área consultiva. Quando desenvolvi o Curso de Prática na Advocacia Criminal pensei na importância de saber aplicar na prática as teses defensivas buscando uma boa atuação na Advocacia Criminal, assim como outros aspectos importantes para o início da carreira na prática penal.
Hoje, pensando no desfecho do caso da Boate Kiss, quero trazer para você um tema de extrema relevância para a sua prática penal que são os elementos da Conduta – dolo e culpa.
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A condenação dos réus por homicídio simples com dolo eventual no caso Boate Kiss
Se você deseja advogar na área criminal, precisa acompanhar casos como este – complexos e de grande repercussão – e estar sempre se atualizando para que tenha uma atuação eficaz na prática da advocacia criminal.
Recentemente (10/12), o juiz do tribunal do júri do caso da boate Kiss anunciou a condenação dos quatro réus acusados por homicídio e tentativa de homicídio por dolo eventual no incêndio que deixou 242 mortos e mais de 600 feridos. As penas chegam a 22 anos de prisão.
Segundo artigo publicado pelo Conjur, o juiz do tribunal do júri disse considerar que,
“É importante dizer que a perspectiva da vítima não é de ser tomada em conta para o juízo de condenação ou absolvição. Isso se faz a partir das provas do processo. Agora, quando há um desprezo completo à condição da vítima, o sistema penal passa a olhar simplesmente para aquele que infringiu a lei. É necessário que olhe também para aquele que, sem infringir a lei, teve sua condição de vida degradada ou piorada.” “O processo penal e a sentença criminal precisam produzir algum apaziguamento no espírito daquele que foi violado por outrem. Eu percebi isso no caso: em alguma medida, as pessoas envolvidas com o episódio enunciaram que se sentiram respeitadas pelo sistema de Justiça. O que, em última análise, significa respeitadas pelo Estado”, finaliza.
A decisão partiu do corpo de sete jurados. O magistrado tinha três sentenças encaminhadas, baseadas nas teses apresentadas pelas partes: absolvição, desclassificação (retirando o dolo) ou condenação.
Fato é que a decisão pela condenação dos réus por homicídio simples com dolo eventual trouxe alguma indignação à comunidade de advogados criminalistas. Alguns dizem que o julgamento pelo delito efetivamente praticado, crime de incêndio culposo (Art. 250 c/c 258, 2º parte, do CP com aplicação da pena do homicídio culposo aumentada de um terço), resultaria em uma pena mais branda.
Nesse sentido, na visão de alguns, a julgamento do caso da Boate Kiss refletiu o sentimento de vingança social, e não a aplicação do Direito Penal brasileiro.
Dolo x Culpa
Mas, quero aproveitar esse caso para trazer a vocês esse relevante tema para a sua prática penal. Muitos advogados criminalistas iniciantes sentem dificuldade com relação ao conceito analítico do crime em geral. Por isso, resolvi aproveitar o caso da Boate Kiss para ensinar, de forma bem simples, a diferença de dolo eventual e culpa consciente e outros pontos básicos importantes.
Inicialmente, vale ressaltar que o dolo pode ser direto ou indireto. E quando for direto pode ser de 1º grau ou 2º grau.
Entende-se por dolo direto de 1º grau a hipótese em que o agente quer o resultado. Já o dolo direto de 2º grau é a consequência necessária (noção de certeza); é o efeito colateral daquilo que se quer.
Exemplificando: Se o agente explode um avião para matar uma pessoa, o homicídio se dará a título de dolo direto de 1º grau quanto a esta vítima e a título de dolo direto de 2º grau em relação a todos os demais passageiros, tendo em vista que a morte deles é consequência necessária daquilo que o agente intencionava.
Dolo eventual x Culpa Consciente
Já o dolo eventual abrange noção de risco. No dolo eventual o agente não se preocupa com o que vai causar, ter como resultado. Ele assume o risco da ocorrência do resultado.
No caso da Boate Kiss, conforme o artigo no Conjur, o juiz que presidiu o julgamento no Tribunal do Júri afirmou que
“A plausibilidade do dolo eventual foi afirmada pelo juiz de Santa Maria, que pronunciou os réus. Isso foi confirmado por dois desembargadores do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul; um votou vencido, o que levou a uma nova apreciação ainda no TJ-RS, quando a votação ficou 4 a 4. Houve recurso para o STJ (Superior Tribunal de Justiça), em que cinco ministros afirmaram a plausibilidade do dolo eventual. Essa plausibilidade foi incrementada por um juízo de certeza dos jurados, que votaram pelo dolo eventual.”
Já a culpa se divide em culpa consciente e culpa inconsciente. Quando falamos da culpa consciente quer se dizer que há previsão. O agente prevê o resultado. Na culpa consciente o agente prevê o resultado, mas acredita que tal fato não irá acontecer. Ou seja, neste caso não há assunção de risco pelo agente.
Dolo eventual e culpa consciente possuem um fator de convergência: Trata-se da previsão. Porém, no dolo eventual o agente não liga para o resultado, assume o risco da sua ocorrência. Na culpa consciente, o agente acredita que não vai acontecer.
Culpa inconsciente é aquela em que o agente não possui a previsão. Ou seja, ele não chega a visualizar o resultado como possível. O agente atua com inobservância do dever objetivo de cuidado, mas não prevê o resultado como possível.
Se você é advogado criminalista e acompanhou o julgamento do caso da Boate Kiss, o que pensa sobre o resultado alcançado? Me conte aqui nos comentários.
A importância da qualificação do Advogado Criminalista
Aproveito para lembrar a você o quanto é essencial que você preze pela sua qualificação! Não canso de dizer que, você deve estar sempre se atualizando, se especializando naquele nicho que escolheu atuar na advocacia criminal, e não somente no início da carreira.
Justamente por isso, no Curso de Prática na Advocacia Criminal, eu, Cris Dupret, tenho o cuidado de abordar desde as primeiras preocupações que um advogado criminalista iniciante deve possuir como, por exemplo, como fazer contato com o cliente, até como se portar em uma audiência criminal e muito mais.
E hoje, trouxe apenas algumas orientações sobre o tema Dolo e Culpa, sem, contudo, esgotar o assunto que abordo com mais profundidade no Curso de Prática na Advocacia Criminal.
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