Médico anestesista é preso em flagrante por estuprar paciente durante parto
O médico foi filmado por funcionários do Hospital da Mulher de São João de Meriti ao cometer crime. A defesa do anestesista disse que aguarda acesso à íntegra dos depoimentos para se manifestar. Vamos aproveitar o caso concreto para relembrar aqui como se caracteriza o estupro de vulnerável, quais as suas hipóteses, a diferença para o art. 213 do CP e outros aspectos?
Assista a aula sobre o tema e, depois, continue a leitura mais abaixo:
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Anestesista é preso em flagrante por estupro de uma paciente que passava por cesárea no RJ
Conforme reportagem do G1, um médico anestesista foi preso e autuado em flagrante, na madrugada desta segunda-feira (11/07), por estupro. Segundo investigadores, o médico abusou de uma paciente enquanto ela estava dopada e passava por um parto cesárea no Hospital da Mulher Heloneida Studart em Vilar dos Teles, São João de Meriti, município na Baixada Fluminense.
A prisão foi feita pela delegada Bárbara Lomba, da Delegacia de Atendimento à Mulher de São João de Meriti, após funcionários da unidade de saúde filmarem o anestesista colocando o pênis na boca de uma paciente quando participava do parto dela.
O Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro (Cremerj) abriu um processo para investigar o caso e tomar medidas administrativas.
A equipe médica vinha desconfiando do comportamento do anestesista e estranhava, por exemplo, a quantidade de sedativo aplicado nas grávidas. Funcionárias do hospital trocaram a sala de parto para conseguir filmar o flagrante.
O médico foi indiciado por estupro de vulnerável, cuja pena varia de 8 a 15 anos de reclusão.
Diferença entre estupro e estupro de vulnerável
Primeiro ponto que devo abordar é a diferença entre estupro e estupro de vulnerável.
Cabe mencionar que, a primeira modalidade de estupro está prevista no artigo 213 do Código Penal e tem como objetivo tutelar a dignidade sexual da vítima, a qual foi constrangida mediante violência ou grave ameaça. Vejamos:
Art. 213. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso: Pena – reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos. §1º Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima é menor de 18 (dezoito) ou maior de 14 (catorze) anos:Pena – reclusão, de 8 (oito) a 12 (doze) anos. §2º Se da conduta resulta morte:Pena – reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos
Já a segunda modalidade de estupro, está prevista no artigo 217-A do Código Penal, e observa-se que neste artigo, não há menção da violência ou grave ameaça, mas tão somente, a vulnerabilidade da vítima.
No entanto, é possível que tal crime ocorra com ou sem a presença de violência ou de grave ameaça à vítima, desde que ela seja considerada pessoa vulnerável. Um dos pontos fundamentais, portanto, é entender que o critério que diferencia o artigo 217-A do Código Penal da previsão contida no artigo 213 é a vulnerabilidade da vítima. Vejamos:
Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos:Pena – reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.§1º Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência.§3º Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave:Pena – reclusão, de 10 (dez) a 20 (vinte) anos.§4º Se da conduta resulta morte:Pena – reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos.§5º As penas previstas no caput e nos §§ 1º, 3º e 4º deste artigo aplicam-se independentemente do consentimento da vítima ou do fato de ela ter mantido relações sexuais anteriormente ao crime.
Hipóteses de vulnerabilidade
Insta salientar que, o capítulo II do título VI prevê crimes sexuais contra vulnerável. O artigo 217 é o primeiro dos crimes sexuais contra vulnerável e prevê três espécies de vulnerabilidade, quais sejam:
1 – Menor de 14 anos;
2 – Quem por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato;
3 – Quem por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência.
Essa última hipótese se encaixa exatamente no caso concreto do médico que abusou da paciente sedada noticiado acima.
Frisa-se que o meio praticado no artigo 217-A não é tão relevante quanto à condição de vulnerabilidade da vítima. Ou seja, independentemente do meio empregado, a prática de ato libidinoso com pessoa vulnerável, caracteriza crime de estupro de vulnerável.
Se a vítima é vulnerável e o agente tem ciência disso, não importa como o ato libidinoso foi praticado (com consentimento, violência, grave ameaça ou fraude), o crime será sempre de estupro de vulnerável.
Também não importa se a vítima tinha anterior experiência sexual ou ainda se havia relacionamento amoroso entre ela e o agente. Neste sentido, o enunciado 593 do STJ, corroborado pela alteração legislativa que incluiu o parágrafo 5º no artigo 217-A:
O crime de estupro de vulnerável configura-se com a conjunção carnal ou prática de ato libidinoso com menor de 14 anos, sendo irrelevante o eventual consentimento da vítima para a prática do ato, experiência sexual anterior ou existência de relacionamento amoroso com o agente
Desta forma, nesses casos, presume-se que toda vítima menor de 14 anos é vulnerável.
No Curso Completo de Direito Penal temos um módulo específico sobre crimes contra a dignidade sexual onde ensino com detalhes as modalidades de estupro e seus aspectos importantes para a prática penal.
Estupro de vulnerável na prática da advocacia criminal
Um dos pontos mais importantes e atuais relacionados ao estupro de vulnerável é quanto à ação penal.
Cabe destacar que a Lei 13718, que entrou em vigor no dia 25 de setembro de 2018, deu nova redação ao artigo 225, para estabelecer que os crimes contra a liberdade sexual, assim como os crimes sexuais contra vulnerável seriam de ação penal pública incondicionada.
Com isso, foi revogada a hipótese de ação penal pública condicionada à representação, que existia para os crimes contra a liberdade sexual, na anterior redação do artigo 225.
O primeiro ponto a ser discutido é a natureza da alteração legislativa. Ao modificar a ação penal em alguns crimes contra a dignidade sexual (arts. 213, 215 e 216 A) de pública condicionada à representação para pública incondicionada, a referida lei foi maléfica. Com isso, o entendimento a favor da defesa seria no sentido de que não poderia haver retroatividade de tal disposição.
Ou seja, para crimes praticados antes da vigência da Lei 13.718, continuaria sendo exigida a representação para que o sujeito ativo respondesse pelo crime.
Esse é um dos temas que exploro detalhadamente no Curso Completo de Direito Penal, que faz parte da Comunidade Criminalistas de Elite, onde abordo toda a parte geral e especial do Código Penal.
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