Progressão de regime no tráfico de drogas
Progressão de regime no tráfico de drogas é um tema importante e polêmico devido às recentes decisões relacionadas ao afastamento (ou não) da equiparação para progredir com o quantum de crime não hediondo.
A Lei 13.964/2019 conhecida como Pacote Anticrime, trouxe várias alterações legislativas importantes, contudo, são mudanças que ainda estão sendo estudadas pela doutrina, magistrados e advogados criminalistas e muitos entendimentos ainda carecem de reconhecimento pacífico pelos Tribunais Superiores.
Eu sou a Cris Dupret, presidente do IDPB e advogada criminalista na área consultiva, especialmente em Execução Penal. Atualmente, também coordeno o Curso Decolando na Execução Penal, que prepara estudantes e advogados em todo o Brasil, capacitando-os para a atuação na Execução Penal.
No artigo de hoje, quero falar com você sobre a alteração do artigo 112 da LEP, suas lacunas legislativas e os atuais julgados sobre afastar ou não a hediondez no crime de tráfico comum para fins de progressão de regime. Vamos lá?
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O Pacote Anticrime e o artigo 112 da Lei de Execução Penal
Sabemos que o Pacote Anticrime reformulou integralmente o artigo 112 da Lei de Execução Penal, criando percentuais específicos para progressão de regime a depender da espécie delitiva praticada.
A progressão de regime passou a ser mais complexa e variável conforme o caso concreto, não se limitando mais às frações de 1/6 (um sexto) para crimes comuns e 2/5 (dois quintos) ou 3/5 (três quintos) para crimes hediondos, dependendo da reincidência. Vejamos:
Observa-se da nova redação que, para os crimes comuns cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, a progressão se dá com o cumprimento de 16% da pena se o autor for primário (art. 112, I), e de 20% da pena se o autor for reincidente (art. 112, II). Lembrando que, a reincidência nesses casos é genérica. Considerando a redação antiga e as novas alterações dadas pela Lei 13.964/19, podemos concluir que, o primeiro inciso retroage e o segundo inciso não pode retroagir.
No caso de crimes comuns cometidos com violência ou grave ameaça, a progressão se dá com o cumprimento de 25% da pena se o agente for primário (art. 112, III) e de 30% da pena se o agente for reincidente específico em infração penal dessa natureza (art. 112, IV). Nesse caso, o legislador deixou uma lacuna, pois não tratou expressamente do caso do agente reincidente não específico em crime cometido com violência ou grave ameaça.
O entendimento dos Tribunais Superiores é de que a Lei n. 13.964/2019 (Pacote Anticrime) revogou o art. 2º, § 2º, da Lei n. 8.072/1990 – dispositivo que não fazia diferenciação entre a reincidência específica ou genérica para a progressão de regime -, estabeleceu novos lapsos para progressão e modificou o art. 112 da Lei de Execução Penal. A norma é expressa ao afirmar que a porcentagem (30%) deve ser aplicada aos condenados reincidentes em crimes cometidos com violência à pessoa ou grave ameaça.
Assim, tratando-se de condenado por crime praticado com violência ou grave ameaça à pessoa, não reincidente em delito de mesma natureza, aplicar-se o lapso de 25% da pena, nos termos do inciso III do art. 112 da Lei de Execução Penal. Em todos esses casos, a LEP não fazia distinção do quantum para progressão, que era de 1/6. Portanto, são casos de novatio legis in pejus, e, portanto, não podem retroagir.
Agora, nos casos de crimes hediondos ou equiparados, sendo o agente primário, a progressão se dará mediante o cumprimento de 40% da pena (art. 112, V). Na redação anterior, a progressão se daria mediante o cumprimento de 2/5 da pena, o que equivale a exatamente 40% previsto pela atual redação.
Já nos casos de crimes hediondos ou equiparados, ocorrendo resultado morte e sendo o agente primário, a progressão somente se dará mediante o cumprimento de 50% da pena (art. 112, VI, “a”). Vale lembrar que, na redação antiga, a progressão se daria com cumprimento de apenas 2/5 (equivalente a 40%) e não havia óbice ao livramento condicional como previsto na redação atual. Desse modo, o novo artigo não pode retroagir.
Da mesma forma, deverá cumprir 50% da pena para poder progredir o indivíduo que exercer comando individual ou coletivo de organização criminosa estruturada para a prática de crimes hediondos ou equiparados (art. 112, VI, “b”). Sendo atualmente considerado como crime hediondo o crime de organização criminosa voltada para a prática de crimes hediondos ou equiparados (artigo 1º., Parágrafo Único, V, da Lei 8.072/90), o novo artigo não pode retroagir.
É exigido o cumprimento da mesma porcentagem de 50% da pena para os condenados pela prática do crime de constituição de milícia privada (art. 288 – A, CP). Antes da alteração pela Lei 13.964/19, a progressão, nesses casos, poderia ocorrer com cumprimento de apenas 1/6 da pena, agora se exige 50%. Portanto, o novo artigo não pode retroagir.
Se o indivíduo for reincidente específico em crimes hediondos ou equiparados, para progredir de regime precisará cumprir pelo menos 60% da pena (art. 112, VII). Antes da alteração, o reincidente tinha que cumprir ao menos 3/5 da pena para progredir, o que equivale os mesmos 60 % previstos atualmente. Lembrando que, o benefício do livramento condicional já era vedado e continua sendo, por força do disposto no artigo 83, V, CP, tendo em vista tratar-se de reincidente em crimes hediondos ou equiparados.
Nesse ponto, surge outra lacuna referente ao indivíduo condenado por crime hediondo ou equiparado que é reincidente genérico (não específico). Atualmente, o entendimento jurisprudencial pacificado é no sentido de, na ocorrência de lacuna legislativa, a interpretação deve ser sempre favorável ao réu. Assim, nesses casos, se a reincidência não for específica, aplica-se o inciso V do artigo 112, que prevê progressão após 40% da pena, se o apenado for condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, se for primário.
Vale ressaltar que, como a redação anterior previa a progressão com 3/5 (equivalente a 60%) aplicável tanto para reincidentes específicos, como para genéricos, no caso dos genéricos, o Pacote Anticrime (Lei 13.964/19) criou novatio legis in mellius, já que agora a progressão se dará com somente 40% da pena. Portanto, deve haver a retroatividade da nova lei para os casos ocorridos antes da vigência da Lei Anticrime.
Por fim, conforme o inciso VIII do artigo 112 da LEP, em caso de reincidentes específicos em crimes hediondos ou equiparados com resultado morte, é exigido o cumprimento de 70% da pena para progressão. Mais uma lacuna surge referente aos condenados por crime hediondo ou equiparado com resultado morte e reincidente genérico. Nesses casos, será aplicado o percentual de 50%, conforme artigo 112, VI, “a”, LEP, devido à falta de previsão expressa do caso.
Bom, são muitas as nuances trazidas pelo Pacote Anticrime ao tema da progressão de regime, que podem gerar muitas dúvidas pela sua complexidade e suas lacunas. Mas, é um tema extremamente importante para o advogado criminalista, que precisa dominar o tema na prática para alcançar a melhor situação para seus clientes.
O tráfico de drogas e a progressão de regime
O Pacote Anticrime (Lei 13.964/2019), ao revogar expressamente o dispositivo que equiparava a hediondez do tráfico de drogas como delito hediondo para fins de progressão de regime, expôs os critérios de progressão no artigo 112 da Lei de Execução Penal, diferenciando frações para os delitos hediondos ou “equiparados”, sem mencionar quais seriam os delitos “equiparados”.
Nesse sentido, o entendimento de vários juízes e Tribunais Estaduais é de que, nenhuma legislação elenca quais delitos são equiparados aos hediondos: Federal, Lei dos Crimes Hediondos, Lei de Execuções Penais ou a Lei de Drogas. Todas restaram omissas, não podendo o Poder Judiciário fazer uma interpretação extensiva no ponto, sob pena de sucumbirmos princípios basilares da democracia como os princípios da legalidade e da anterioridade.
Por outro lado, no parágrafo quinto do artigo 112 da LEP, o legislador afastou a hediondez do chamado “tráfico privilegiado”:
“§ 5º Não se considera hediondo ou equiparado, para os fins deste artigo, o crime de tráfico de drogas previsto no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006”.
Nesse sentido, o novo parágrafo 5º do artigo 112, ao vedar o tráfico privilegiado como equiparado ao hediondo, não constitui fundamento para que o caput do artigo 33 ou outro delito, seja definido como “equiparado a hediondo”, simplesmente porque uma norma que beneficia o apenado não pode ser interpretada para prejudicá-lo. Diga-se de passagem, o referido parágrafo somente reproduziu jurisprudência pacífica dos Tribunais, de modo a não servir como base legal para incutir a outros delitos equiparação a hediondez.
Desta forma, alguns advogados criminalistas e juízes estaduais defendem e reconhecem que houve uma alteração da lei penal em benefício do apenado, qual seja, o afastamento da hediondez do tráfico de drogas para fins de aferição do percentual para progressão de regime. Lembrando que, a lei benéfica retroage em benefício o réu.
Nesse sentido, recentemente, tivemos algumas manifestações (favoráveis e desfavoráveis) dos Tribunais Superiores referentes ao tema em questão. O que podemos perceber é que, ainda é um tema delicado, que carece de entendimento pacificado.
Na Sexta Turma do STJ, ao julgar o AgRg no HC 729.256/SP em 02 de maio, o Ministro Antônio Saldanha decidiu que, “não se pode concluir que, por força da alteração legislativa em questão, o ordenamento jurídico tenha deixado de considerar o tráfico comum (art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006) como crime equiparado a hediondo, sob pena de se desprestigiar a interpretação sistemática da legislação vigente (art. 5º, XLIII, da CF, c/c o art. 2º, I e II, da Lei n. 8.072/1990).” Leia a íntegra clicando aqui.
A Quinta Turma do STJ, ao julgar o HC 729.332, estabeleceu que as alterações promovidas pela Lei 13.964/2019 – conhecida como Pacote Anticrime – na Lei 8.072/1990 não retiraram a equiparação do delito de tráfico de entorpecentes a crime hediondo. O colegiado destacou que a classificação da narcotraficância como infração penal equiparada a hedionda está prevista na própria Constituição (artigo 5º, inciso XLIII). Clique aqui para ler esse post.
Por sua vez, uma decisão do STF foi publicada em 06 de maio referente ao julgamento do HC 214.747/SP, ocasião em que o Ministro Alexandre de Moraes concordou com a decisão recorrida do STJ que concluiu pelo seguinte entendimento: “a revogação do § 2º do art. 2º da Lei 8.072/90 não tem o condão de retirar do tráfico de drogas sua caracterização como delito equiparado a hediondo. Isso porque a classificação da narcotraficância como infração penal equiparada a hedionda decorre da previsão constitucional estabelecida no art. 5º, XLIII, da Constituição Federal”, “não se pode concluir que, por força da alteração legislativa em questão, o ordenamento jurídico tenha deixado de considerar o tráfico comum (art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006) como crime equiparado a hediondo, sob pena de se desprestigiar a interpretação sistemática da legislação vigente (art. 5º, XLIII, da CF, c/c o art. 2º, I e II, da Lei n. 8.072/1990).” Leia a íntegra clicando aqui.
Por outro lado, já tivemos algumas liminares deferidas pelo STJ para determinar a alteração provisória dos cálculos de pena do paciente, devendo ser considerados as frações de crime comum para condenação pelo delito de tráfico de drogas, ou seja, afastando a hediondez do crime de tráfico para fins de progressão de regime.
A primeira liminar favorável foi a do relator Ministro Sebastião Reis do STJ, ao julgar o pedido no HC 736333, ocasião em que concedeu a tutela de urgência para determinar a alteração provisória dos cálculos de pena do paciente, até o julgamento do mérito do writ , devendo ser considerados as frações de crime comum para condenação pelo delito de tráfico de drogas.
Na mesma semana, o mesmo Ministro havia indeferido liminar com pedido similar em outro HC (737.479). A advogada do caso, com base na decisão do HC 736.333, requereu a reconsideração da decisão liminar que havia indeferido o pedido similar e obteve o pedido acolhido.
O relator Gilmar Mendes do STF, ao julgar o HC 214189/SP, sobre pedido de afastamento de hediondez em crime de tráfico de drogas para fins de progressão de regime, reafirmou que o mérito da controvérsia não foi apreciado pelo colegiado do Superior Tribunal de Justiça, de modo que a apreciação pelo STF resultaria em supressão de instância.
O ministro Sebastião Reis Jr., da Sexta Turma do STJ, deferiu liminar em habeas corpus (741.004/SC) para determinar que fração de progressão de crime comum seja utilizada em condenação por tráfico. Destacou o ministro que, “no caso, em juízo de cognição sumária, tem-se que razão assiste à impetração, uma vez que o permissivo legal que equiparava o delito de tráfico de drogas a hediondo – a progressão de regime, no caso dos condenados pelos crimes previstos neste artigo, dar-se-á após o cumprimento de 2/5 da pena, se o apenado for primário, e de 3/5, se reincidente, observado o disposto nos §§ 3º e 4º do art. 112 da Lei n. 7.210, de 11 de julho de 1984 (art. 2º, § 2º da Lei n. 8.072/1990) – foi revogado pela vigência da Lei n. 13.964/2019.” Isso porque a aparente ausência de disposição legal equiparando o crime de tráfico de drogas a delito hediondo não poderia ser suprida por ato extralegal.
Portanto, podemos concluir que, essa é uma tese que ainda carece de reconhecimento pacífico pelos Tribunais Superiores e, por isso, os advogados criminalistas precisam continuar valendo-se dessa alegação, pois o afastamento da hediondez do tráfico para fins de progressão é uma conclusão lógica que exsurge da análise das alterações promovidas pela Lei Anticrime e já é tese aceita em vários Tribunais Estaduais.
Como essas decisões estaduais, existem muitos outros juízes se posicionando nesse mesmo sentido para afastar a hediondez do crime de tráfico de drogas para fins de progressão de regime. No Curso Decolando na Execução Penal, você poderá encontrar essas decisões na íntegra.
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